Palavra Pastoral IMeL Saúde 186

16 de Setembro de 2023

Fé e conduta: os privilégios e responsabilidades de todos os cristãos

Neste domingo vamos seguir nossa reflexão sobre Fé & Conduta no segundo capítulo da carta aos Gálatas. Veremos como Paulo lida com uma situação na qual o discurso dos líderes não encontrava consistência com o comportamento deles. Veremos como isso impactou a vida de outras pessoas na igreja. O fato de sermos líderes não nos livra do risco da incoerência, tempo de estrada, posição, títulos não nos livram da crise de integridade entre discurso e prática. Esta incoerência cria uma crise de autoridade, afinal, autoridade desprovida de exemplo está desprovida de autoridade! 

Enquanto refletia no texto bíblico para o próximo sermão, o Senhor Jesus me permitiu viver uma situação na qual foi necessário reconhecer que meus planos não encontraram correspondência na minha realidade da vida. O Senhor me permitiu ser confrontado, nesta situação, por meio de minha treinadora de corrida. Vocês podem se perguntar, “mas uma pessoa que não se identifica como cristã pode ser usada por Deus para ensinar a um líder cristão?” A resposta é sim! Deus pode usar a quem ele quiser, para ensinar ao seu povo. 

Jesus indicou algumas vezes como isso ocorria nos seus dias, por meio de exemplos como o do centurião na cidade de Cafarnaum (Mateus 8:5-13). Vale a pena destacar um conceito teológico importante: Graça Comum. Graça Comum é aquela graça que Deus concede de forma indistinta a todas as pessoas do mundo, como expressão de sua bondade e misericórdia, que expressam a maneira como ele trata a raça humana.  A graça comum não faz distinção entre um crente e um não crente. A graça comum se manifesta de forma ampla, permitindo que todos possam aprender e ensinar.

Compartilho com vocês a lição que precisei aprender por meio de minha treinadora, uma lição onde a minha intenção e a minha forma de viver não estavam em sintonia. Nesta semana minha treinadora me trouxe a memória a meta que tinha estabelecido para este ano de 2023: voltar a correr uma maratona. Minha última maratona foi em Santiago-Chile em 2019, uma prova onde, pela primeira vez, tive que lutar com as fortes cãibras. Com o passar dos anos minha preparação para as provas de longa distancias passou a exigir alguns cuidados adicionais, no Chile, errei no ritmo e na hidratação.

A pandemia de Covid, algumas lesões, o ganho de peso e a dificuldade de manter a continuidade nos treinos, não me permitiram alcançar a meta que me tinha proposto para este ano. Voltei aos treinos, mas minha condição física geral não me permitiu atingir o objetivo. Meu discurso não encontrou, na realidade, respaldo. Sonhei muito alto. Para uma meta tão ousada meu compromisso de treino deveria ter sido muito diferente.

Enquanto conversava sobre a necessidade de ajustar minhas expectativas, a minhas reais condições e possibilidades, me lembrei de recomendação de Jesus a Pedro: "Eu lhe digo a verdade: quando você era jovem, podia agir como bem entendia; vestia-se e ia aonde queria. Mas, quando for velho, estenderá as mãos e outros o vestirão e o levarão aonde você não quer ir" (João 21:18).

Estas palavras de Jesus soaram fortes enquanto ouvia as recomendações da treinadora para ajustar minhas expectativas, considerando minhas reais possibilidades. Numa manhã de treino no parque, ouvindo as orientações sensatas de minha treinadora, meu coração dizia:” aprenda a lição de Pedro, escute com atenção o Evangelho na boca de tua treinadora!” Depois de pensar um pouco respondi assim a minha treinadora: “então Lu, confio na tua percepção e orientação, defina uma meta que lhe pareça razoável. Eu seguirei tuas orientações!” Chegou o meu tempo de ouvir o Evangelho com o corpo, com a perspectiva de alguém que entrou na etapa na qual posso dizer: “agora que sou velho!” 

Foi muito bom correr várias maratonas, não sei se terei condições de voltar a estas provas de longa distâncias, mas é bom contar com um olhar atento e uma orientação cuidadosa para me ajudar a estabelecer metas apropriadas. Eu sei que as longas distâncias se correm um passo de cada vez, por isso não desprezo os pequenos começos (aquela outra dimensão do Evangelho, “basta cada dia”). Muito bom aprender a ler o Evangelho, não apenas com a mente e coração, mas também com as percepções do corpo, corpo este que se transforma, apresentando novos limites, mas também novas possibilidades. 

No meu caso Deus usou a minha treinadora para chamar atenção para minha incoerência, e para a necessidade de ajustar minhas expectativas com a intensidade e possibilidade dos meus treinos. Ela me deixou com as seguintes perguntas: será que as maratonas ainda são as melhores provas para você? Não seria melhor pensarmos em outras distâncias para poder seguir correndo com alegria e assim preservar a saúde?  Uma excelente confrontação para me tornar coerente. Estou refletindo sobre o que Pedro precisou ouvir de Jesus. Já no texto de Gálatas, Pedro precisou ser confrontado por Paulo: “Mas, quando Pedro veio a Antioquia, tive de opor-me a ele abertamente, pois o que ele fez foi muito errado(...) Quando vi que não estavam seguindo a verdade das boas-novas, disse a Pedro diante de todos: “Se você, que é judeu de nascimento, vive como gentio, e não como judeu, por que agora obriga esses gentios a viverem como judeus?” (Gl 2.11 e 14)

Todos nós, líderes ou não, somos chamados a viver de acordo com os princípios, valores e ensinos do Evangelho. Nossa forma de viver a fé cristã na família, na comunidade e no mundo, sempre impacta pessoas. Podemos, por nosso exemplo, conduzir as pessoas a Jesus Cristo, ou podemos influenciá-las na direção oposta. Nossa forma de viver revela nossa forma de compreender o Evangelho e as pessoas ao nosso redor estão muito atentas a isso. O desafio para cada um de nós é nos perguntarmos se nossa forma de viver reflete a verdade das boas novas. 

 Ziel Machado